Dom Casmurro foi escrito por Joaquim Maria Machado
de Assis, tendo sua primeira publicação em 1899. Por um longo período, a obra foi
lida de maneira que Bento Santiago era considerado inocente, até que uma opinião
contrária surgiu, no início da década de sessenta, quando a escritora Helen
Caldwell, autora do livro O Otello Brasileiro de Machado de Assis, fez com que a
leitura obtivesse duas interpretações: adultério e ciúmes. A obra sempre será
uma incógnita, não só por causa da traição, mas também por diversos outros
aspectos que se escondem nas entrelinhas.
Bento Santiago, em sua velhice, recebe o apelido de
Dom Casmurro, por ser chato e resmungão, daí o nome “Casmurro”— já o “Dom” se
insere na alcunha para dar ares de fidalgo à personagem. A história é contada
em primeira pessoa, com o propósito de atar as duas pontas da vida de Bento, tentando
restaurar na velhice, a juventude. Ele tenta isso na decoração de sua
residência, reproduzindo a casa de Matacavalos, retratando as mesmas pinturas,
as mesmas janelas e até uma chacrinha. Entretanto, a única coisa que ele não
consegue reprisar são os sentimentos. É muito fácil se recuperar da perda de um
ente querido, mas não se consegue viver com a perda de si próprio. Como já
dizia Cecilia Meireles, em um de seus poemas, “Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim
magro, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Em que espelho ficou
perdida a minha face? ” Em qual espelho Bentinho se perdeu?
Ao usar referências a Otello, na questão da
traição, Machado de Assis põe a dúvida diante de nossos olhos. Pois na obra shakespeariana,
o personagem principal é um general de Veneza, negro e que se apaixona pela moça
mais linda da cidade: Desdêmona, filha de Brabâncio (que é um dos senadores
mais poderosos dali). Otello se casa com Desdêmona em segredo. O vilão, Iago, trabalha
em prol de uma vingança contra Otello, pelo simples fato do protagonista ter
nomeado Cássio ao cargo de tenente. Para que sua vingança se concretize, Iago
cria uma falsa ideia de que Cássio e Desdêmona estavam tendo um caso. O fim
trágico dessa história nós já sabemos. Uma coincidência interessante é o nome
da personagem de Machado de Assis: Bento Santiago: Sant/Iago. Seria Bentinho
seu próprio Iago?
Outra hipótese é a de que a relação de Escobar e
Bentinho seria recheada de inveja, uma vez que Bentinho era senhor de escravos,
seus negócios estavam caminhando ao declínio, e Escobar era comerciante. A lógica
é que enquanto os negócios de Bentinho só desciam, os de Escobar ascendiam cada
vez mais. Outro aspecto a se considerar é que logo após o nascimento do primeiro
filho de Escobar com Sancha, Bentinho começou a enlouquecer porque não
conseguia engravidar Capitu.
Assim como um simples lenço foi o ponto certeiro
para que Otello cometesse toda aquela tragédia, um acidente foi a faísca que
incendiou todo o casamento de Bentinho e Capitu. Munido de um ciúme
incontrolável, Bentinho não suportou ver a esposa chorando mais que Sancha no
velório de Escobar, mesmo não podendo afirmar que isso seja verídico. Afinal,
Bentinho é advogado, e como todo bom advogado irá defender sua causa, nem que
para isso tenha que mentir.
Após todos
esses acontecimentos, ele chega à conclusão de que Ezequiel não é seu filho. Até
tenta um suicídio, mas por fim prefere romper o casamento com Capitu, que
decide ir embora com o filho para a Europa.
Outra pista que Machado de Assis deixou, acontece
quando ele cita que Capitu tinha semelhanças com a mãe de Sancha, como dito na
frase: “Na vida há dessas semelhanças
assim esquisitas”, idealizando na mente do leitor que mesmo Ezequiel tendo
uma estranha semelhança com Escobar, poderia ser uma mera coincidência. Nada se
pode afirmar sobre uma suposta paternidade de Escobar!?
“E bem, e o resto?
” e o que restou foi a tristeza de um homem que criou a imagem de uma garota
dona dos “olhos de ressaca”, iguais
às do mar que chega forte e avassala tudo que vê pela frente, ou então os “olhos de cigana, obliqua e dissimulada” que
de forma ardilosa vai se curvando da verdade, da fidelidade, ou até mesmo da
obediência ao marido. Mas mesmo Capitu tendo defeitos, Bentinho há de reconhecer
que nenhuma outra mulher o fez esquecer a amiga de infância, a vizinha alegre,
a primeira amada e a única dona de seu coração. Com isso, ele suplica aos céus
o seu arrependimento: “Jesus, filho de
Sirach, se soubesse dos meus primeiros ciúmes, dir-me-ia, como no seu cap. 9,
vers. I: Não tenhas ciúmes de tua
mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti”.
Créditos finais
Desde muito cedo, sou apaixonada pela história de Dom
Casmurro. E foi através do curso de Letras e da minha profissão de professora
que tive a iniciativa de tentar fazer uma pesquisa aprofundada sobre a obra. Claro
que nem tudo eu consegui sozinha, tive que estudar bastante, tive que ler
várias analises literárias para conseguir reunir os pontos que eu achava mais
importantes. O propósito deste texto é também poder ajudar os alunos que de um
jeito ou outro dependem da obra para vestibulares, concursos ou algo mais. Por
fim, espero eu, conseguir fazer com que meus leitores conheçam dois lados de
uma mesma história. Se você encontrou outros aspectos que não foram mencionados
aqui, deixe nos comentários, terei um enorme prazer em ler! Obrigada!
Por Rosa Rezende
Revisão de Miguel de Assis
Imagens: Minissérie Capitu exibida pela emissora Globo
Adorei seu texto!
ResponderExcluirVocê usou bem a residualidade para mostrar traços de Otello na obra do Machado de Assis, além de conseguir fazer uma análise psicológica dos personagens, explicando o porquê de toda essa paranoia de que Capitu o traiu ou não.
Me deu ainda mais vontade de ler literatura nacional clássica, mais especificamente Dom Casmurro em si. Parabéns!
Alexandre de Almeida – Colunista do Blog Alexandria
alexandriabooks.wordpress.com
Muito obrigado, comentários como o seu faz com que o blog cresça!❤
ExcluirLivro fantástico! Adorei o relato! Preciso rever a minha lista de leitura de literatura clássica brasileira! :)
ResponderExcluirObrigado :)
ExcluirÓtimo texto! Muito informativo e gostoso de ler! Eu nunca me interessei muito por literatura clássica brasileira, mas já ouvi falar MUITO de Dom Casmurro. Interessante saber de onde surgiu o nome e tudo mais. A dúvida que não quer calar, acho que nunca saberemos com total certeza se Capitu traiu mesmo Bentinho!
ResponderExcluirOii!
ResponderExcluirEu acho esse livro incrível! Li faz alguns anos, por conta da leitura obrigatória da escola, e lembro de ter sido uma das únicas a amar a história. Machado é rebuscado, verdade, mas essa história é muito bem escrita, envolvente, achei impossível não gostar haha
Acho um pouco irritante aquela coisa de sempre focarem na traição ou não da Capitu, sendo que o livro trata de muitas outras coisas!
Enfim, adorei o post :)
Beijoss
Vida em Marte
Afinal, Capitu traiu ou não Bentinho?
ResponderExcluirConfesso para você minha linda, que eu não consigo ler livros clássicos. Acho muito chato e massante até que eu comecei a ler o da barca do inferno e adorei. Eu assisti o teatro de Dom Casmurro e gostei bastante que até tive vontade de ler, eu tentei.. mas, não deu! Vou tentar mais uma vez, aproveitar que seu texto me motivou.
Já assistiu a série Capitu produzida pela Globo, assista é perfeito!
ExcluirNossa! Eu amei tudo! A forma como você escreveu, a estrutura do texto, as imagens... Tudo tão perfeito! Eu amo Dom casmurro e acho a literatura clássica nacional um tesouro pelo qual nós devemos zelar. Parabéns pelo belo trabalho! Sucesso!
ResponderExcluirObrigado, que bom que gostou!
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